É um fato que a forma de gerir os patrimônios está mudando, com uma evolução do modelo em direção a uma maior especialização. Assim destacou Sila Piñeiro Lores, diretora DPM do Deutsche Wealth Management e vice-presidente do CFA Spain durante o evento Funds Society Leaders Summit. A especialista participou como moderadora da mesa Family Office, necessidade ou moda?, da qual também participaram Marta Alonso, Diretora Geral da OpenWealth; Borja Durán, CEO & Fundador da Wealth Solutions e Daniel de Fernando García, Managing Partner da MdF Family Partners.
Mais profissionalização e sofisticação
“Somos uma necessidade. As famílias constatam que precisam dos nossos serviços”, reivindicou Marta Alonso. A representante da OpenWealth falou do “desafio constante” que significa a gestão e preservação da riqueza e do legado dos grandes patrimônios, que não só requer “estruturas bem definidas e conhecimento sobre muitos assuntos” – que vão além do patrimônio, pois também englobam aspectos como confidencialidade ou cibersegurança –, mas também um importante trabalho de acompanhamento e planejamento da estratégia familiar. “Ninguém duvida de que as empresas precisam fazer um plano de negócios. A família também precisa fazer um planejamento estratégico e manter a coesão para preservar o legado”, insistiu.
Alonso também mencionou a crescente sofisticação na gestão de patrimônios familiares, que caminhou junto com a sofisticação dos próprios mercados financeiros. Essa evolução está resultando na demanda por profissionais mais qualificados, dando espaço a uma maior difusão do conceito de multi family office, modelo seguido pela OpenWealth.
Borja Durán, por sua vez, focou no crescente grau de profissionalização das famílias, algo que considera importante dado que dentro do conceito de patrimônio familiar cabem muitos ângulos de abordagem: “Felizmente, as famílias e os provedores sabem fazer um due diligence para distinguir”, afirma. O representante da Wealth Solutions também destacou as perspectivas favoráveis para o negócio dos family offices: “À medida que houver mais players participantes, mais awareness será criado em torno do conceito”.
“Cada família é diferente e precisa de coisas diferentes. Nós temos um consultor por família, elas requerem muita atenção individualizada”, declarou Daniel de Fernando, da MdF Family Partners. Ele lembra que, antigamente, as famílias costumavam dividir seu patrimônio entre vários bancos para delegar sua gestão; dois aspectos que diferenciam os family offices são a especialização “não se trata de fazer tudo, mas de dar soluções” – e a proximidade: “As outras necessidades que as famílias têm não são tão visíveis, vemos que muitas se aproximam de nós porque tiveram uma experiência prévia ruim. Normalmente começam perguntando como investir, mas debaixo da ponta do iceberg há muito mais”, resumiu.
Por fim, o especialista refletiu sobre como a crescente sofisticação no wealth management está levando ao surgimento de mais provedores especializados, um modelo que considera “mais eficiente”. “Além do crescimento da riqueza, esse entendimento da indústria com provedores especializados na cadeia de valor é vencedor”, observou.
Rentabilidade x valor agregado
O segundo ponto levantado por Piñeiro girou em torno da rentabilidade desse modelo de negócio frente às qualidades que os clientes demandam. Marta Alonso destacou a independência da OpenWealth: “Não damos o passo de oferecer serviços de gestão de carteira ou de assessoria, ficamos na parte de pura consultoria estratégica. Nossa independência tem três aspectos: em produto (não só patrimônio financeiro, também imobiliário e outros ativos privados), em bancos (analisamos todos os provedores financeiros) e em receitas, porque não cobramos em função do volume que a família administra, mas sim uma taxa de consultoria como se fosse um escritório de advocacia”.
Na Wealth Solutions, Durán explicou que 70% das famílias apoiadas já contam com seu próprio single family office: “Nós somos uma forma de complementar ou compartilhar best practices. Oferecemos alternativas de investimento que vimos através da nossa experiência e ajudamos com o que pode encaixar melhor”. O especialista destacou que, entre as qualidades que seus clientes valorizam, estão aspectos como “a discrição, a ausência de conflitos de interesse e o completo alinhamento de interesses”, fatores que fazem com que o modelo de negócio não seja “tão escalável nem fácil de aplicar”. Ele também defendeu a especialização na hora de oferecer serviços com esta reflexão: “Nos family offices tem que haver dois livros: um muito grosso do que você não vai fazer, e um bem pequeno do que vai fazer. Como cada cliente é distinto, temos que nos adaptar à nossa especialidade; se quisermos fazer o que todos fazem, seremos medíocres e não teremos sucesso”.
Na MdF Family Partners, de Fernando foi direto: “Não passaríamos em um teste de rentabilidade da Caixa”. Explicou que sua firma sim pode gerar economias de escala “porque há uma parte do processo que pode ser compartilhada”, mas acrescentou que “a fase final é muito distinta, pois depende de cada família”. O especialista afirmou que a indústria caminha para um cenário de retornos mais baixos e difíceis de alcançar, no qual é necessário realizar uma educação financeira dos clientes que não considera simples: “Nos obriga a gastar mais dinheiro, porque precisamos passar mais tempo com nossos clientes”, daí que concluiu: “As taxas de rentabilidade agressivas não são compatíveis com a visão de personalização”.
O papel dos mercados privados nas carteiras dos family offices
Essas observações levaram ao terceiro tema do painel: o investimento em ativos privados. Desde a OpenWealth, sua representante afirmou que “os mercados privados fazem parte do planejamento estratégico, mas é necessário um trabalho educativo para que as famílias entendam”.
Na MdF, Daniel de Fernando explicou que sua firma incorpora esse tipo de ativo desde o início em 2008, mas concordou que “o problema dos mercados privados é entendê-los e entender que não são para todo mundo”. Também destacou a necessidade de conhecer profundamente as características dos diferentes ativos que compõem os mercados privados e de acompanhar de perto as famílias para ajudá-las a tomar as decisões corretas, evitando o oportunismo: “Os mercados privados são muito delicados, é preciso conhecê-los de verdade e as decisões são complicadas”. “Mercados privados sim, mas sendo especialistas e objetivos”, concluiu.
Na Wealth Solutions, Borja Durán explicou que, desde 2012, sua firma constatou uma redução no peso das alocações em real estate e um aumento em alternativos, apontando certa rotação: “Os espanhóis vão convergindo em um ritmo muito lento para uma menor exposição em imobiliário. Ainda têm alocações de 60-70% frente a 15% de investidores internacionais”. Dito isso, Durán acrescentou que a atividade em mercados privados na Espanha “ainda é incipiente e tem muito caminho pela frente, porque há muitos eventos de liquidez e operações corporativas que estão gerando necessidades”.
Desafios
A última parte do painel girou em torno dos desafios que o negócio de family office enfrenta na Espanha. Borja Durán destacou dois desafios geracionais: a transferência de riqueza e a globalização das famílias, “com parentes em todas as partes do mundo, com diferentes regimes fiscais, tipos de união muito diversos e situações testamentárias muito complexas”.
Também ressaltou a importância do talento, embora tenha esclarecido que “é um talento distinto, nem todo mundo é adaptável ao family office”. O especialista apontou que o setor enfrenta seu próprio desafio geracional, por se tratar de um setor intensivo em capital com margens baixas, “portanto o setor cresce, mas também não entram muitos competidores porque é difícil ganhar a vida”.
A diretora geral da OpenWealth também enfatizou a gestão do legado: “A formação das próximas gerações, conseguindo coesão familiar e trabalhando no legado de base; é um grande desafio ao qual as famílias devem dedicar tempo”. Alonso também destacou a importância de encontrar e reter talentos e de incorporar tecnologias que ajudem a melhorar a rentabilidade.