Em um cenário de juros elevados, pressão inflacionária e transição energética, garantir o equilíbrio do portfólio e a perenidade de compromissos previdenciários é um desafio para os fundos de pensão brasileiros. Para dar um panorama sobre as estratégias de investimentos para navegar em mercados mais voláteis, o 14º Seminário Gestão de Investimentos nas EFPC, promovido pela Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp), convidou especialistas para debater o tema nos dias 28 e 29 de maio em São Paulo.
Diante do contexto macroeconômico de ruptura da dinâmica do comércio internacional, as expectativas sobre inflação e juros são impactadas, gerando uma desaceleração da atividade econômica globalmente. “Para o alocador de recursos, o cenário é desafiador pelo ambiente de juros altos, que são menores que no passado recente em alguns países, mas que ainda passam pelo risco fiscal não somente no Brasil, e sim no mundo, o que faz com que o prêmio de risco da parte longa da curva fique um pouco maior”, disse Marianna Costa, economista chefe da Mirae Asset.
No cenário externo, os Estados Unidos ainda mantêm o dólar forte perante outras moedas, mas devido a um governo mais “truculento” em relação às tarifas comerciais, o valor da moeda e o prêmio adicional dos ativos estão em xeque. “Há dúvida sobre a possível recessão desta economia. Em um cenário de desaceleração forte de todas as economias, a aversão ao risco deve prevalecer”, pontuou.
Já na Europa, o Banco Central estava em um movimento de corte das taxas de juros e desaceleração pronunciada da atividade, mas a economia está em expansão fiscal, enquanto na Ásia, as economias são mais impactadas pelas tarifas que os Estados Unidos tentam impor. “A partir de 2026 e em 2027, a China deve encontrar outros parceiros comerciais e a cadeia produtiva deve se acomodar”, avaliou Marianna Costa.
Para ela, o Brasil está em uma situação um pouco mais privilegiada em relação à moeda, mas os juros elevados e a inflação resistente, relacionados à atividade econômica e ao mercado de trabalho aquecido, impactam diretamente o avanço da economia local. “Para o Banco Central cortar juros no Brasil, a inflação deve apontar para a meta, mas o risco é que a taxa de juros fique elevada por mais tempo, o que impacta a atividade econômica”, disse.
Assim, os prêmios de risco dos títulos públicos devem continuar altos, e o endividamento público ao longo do tempo deve ser gradativamente pior, com impacto ainda maior em 2026, quando ocorre a eleição presidencial. “Não é um cenário trivial para o alocador de recursos”, comentou a economista da Mirae.
Diversificação – O cenário global incerto apontado por Marianna Costa mostra, mais uma vez, que a adequada diversificação é fundamental no longo prazo e um pilar importante para uma boa estratégia de investimento. Com essa visão, Letícia Albuquerque, head de investment solutions da Tivio Capital, apresentou qual o posicionamento da asset em relação a cada classe de ativo.
Na renda fixa, os títulos prefixados são classificados em uma alocação neutra. “As duas classes que têm uma alocação acima do neutro são os títulos indexados à inflação e os fundos de renda fixa”, disse.
No segmento de crédito privado, a gestora também segue com alocação neutra, mas o corporativo está em um nível abaixo do neutro em função do cenário de fechamento de spreads, explicou a gestora da Tivio. “Outra classe que estamos olhando com mais atenção é o crédito estruturado. Do ponto de vista de moedas, a alocação está neutra no dólar”.
A classe dos multimercados segue com alocação neutra e, a despeito do cenário desafiador ao longo dos anos, a asset acredita que ainda há geração de valor no portfólio dos clientes. “Na classe de renda variável internacional, carregamos posição acima do neutro e agora fizemos uma redução”, acrescentou Letícia Albuquerque, que reiterou a gestão ativa como importante no Brasil, mas que o ideal é mesclar as estratégias. Por fim, ela apontou a alocação internacional como um pilar fundamental para diversificação e proteção dos portfólios.
Alocação em renda variável – Aprofundando mais nos investimentos em renda variável, Roberto Belchior, sócio da Tarpon, deixou uma mensagem inicial: “não existe melhor forma de gerar patrimônio no longo prazo do que ações”.
Ele pontuou que, mesmo com juros estruturalmente altos no Brasil, há uma série de segmentos, setores e indústrias com mercados muito pulverizados. “A oportunidade de geração de retorno para o acionista aqui é, talvez, encontrada em poucos lugares do mundo”.
Belchior defende que a alocação em ações deve ser estratégica, sem market timing, apresentando um estudo da Tarpon realizado desde 2013 que avalia os retornos de longo prazo em renda variável como severamente impactados negativamente se os investidores perderem 10 dias de alocação em ações.
Sua visão aponta ainda para um otimismo em relação ao fluxo de capital estrangeiro voltado ao Brasil, principalmente diante do receio de movimentos dos Estados Unidos em relação às tarifas comerciais impostas às demais nações. “Os países receiam ter suas reservas tomadas, o que os levaria a desviar seus recursos para outros locais do mundo. O Brasil surge, mais uma vez, quase que como um competidor único para receber esse fluxo de investimento internacional”, acredita Belchior.
Para o investidor estrangeiro, o Brasil é um mercado emergente, o que traz uma assimetria ao portfólio negociada a um prêmio de risco adicional que já está calculado pelos alocadores. “Esse fluxo internacional ainda nem começou”, apontou o gestor da Tarpon.