A última reunião do ano do Banco Central Europeu (BCE) terminou sem surpresas nem mudanças em suas orientações. Em concreto, a instituição monetária manteve as taxas de juros inalteradas, em linha com todas as expectativas, e apresentou suas novas perspectivas com uma revisão para cima das previsões de crescimento para a zona do euro.
O corpo técnico do BCE prevê agora que a zona do euro cresça mais rapidamente até 2028, já que a demanda interna, especialmente o investimento, permanece resiliente. Além disso, a presidente do BCE, Christine Lagarde, destacou tanto os possíveis impulsos ao crescimento decorrentes do aumento dos gastos públicos quanto os entraves representados pelo ressurgimento das tensões geopolíticas. Prevê-se que a inflação subjacente se mantenha próxima da meta, com uma inflação geral ligeiramente inferior a 2% em 2026 e 2027.
“Embora a melhora nas previsões de crescimento fosse amplamente esperada pela maioria, o aumento da inflação subjacente acima ou em torno da meta até 2028 deveu-se à suposição de que a inflação de serviços permaneceria um pouco elevada por mais tempo. Fora isso, a presidente Lagarde manteve-se nos temas esperados: sem uma trajetória definida para a política, decisão reunião por reunião e dependente dos dados. A reação dos mercados confirmou que, por enquanto, o BCE continua em uma posição confortável, com capacidade para observar os acontecimentos da arquibancada”, aponta Dave Chappell, Senior Fund Manager, Fixed Income da Columbia Threadneedle Investments.
Que mensagem o BCE transmite?
Na opinião de Felix Feather, economista da Aberdeen Investments, essa postura envia um sinal claro: as taxas não serão ajustadas por algum tempo, a menos que a economia enfrente uma crise imprevista. “Da mesma forma, as mudanças nas previsões do BCE também se ajustaram às expectativas. Vale destacar que as previsões de crescimento foram revisadas para cima. Essa mudança aproxima as estimativas do BCE das nossas. Dado que a atividade econômica permanecerá resiliente em geral e que a inflação provavelmente ficará próxima da meta, não esperamos nenhum ajuste das taxas por parte do BCE durante 2026”, afirma Feather.
Simon Dangoor, vice-diretor de investimentos (CIO) de renda fixa e diretor de estratégias macroeconômicas de renda fixa na Goldman Sachs Asset Management, concorda que essa última decisão sugere que o BCE manterá as taxas inalteradas no futuro imediato. “Embora exista alguma margem para uma maior flexibilização no próximo ano se a inflação cair muito abaixo de 2%, essa probabilidade foi reduzida. Por outro lado, a possibilidade de uma alta de juros em 2026 nos parece muito baixa, dado o contexto de inflação moderada, apesar da recente retórica agressiva de alguns membros do comitê”, argumenta.
“A presidente do BCE quis dissipar as especulações sobre se o próximo movimento das taxas será para cima ou para baixo, ressaltando que todas as opções continuam sobre a mesa. Dessa forma, o mercado interpretou a mensagem como um sinal de que não haverá mudanças nas taxas de juros ao longo de 2026, razão pela qual faz sentido que se precifique a manutenção do nível de 2% durante o próximo ano”, acrescenta Miguel Ángel Rico, diretor de investimentos da Creand Asset Management.
Postura cautelosa
Em contrapartida, para Roelof Salomons, estrategista-chefe de investimentos do BlackRock Investment Institute, a mensagem que temos diante de nós é diferente, ao menos a mais relevante. Na opinião de Salomons, o BCE está caminhando sobre uma corda bamba, razão pela qual sua decisão de manter as taxas estáveis é a correta. “A melhora das perspectivas de crescimento obscurece o que se entende por taxa de juros neutra, que não estimula nem restringe o crescimento. Nossa hipótese base é que o BCE manterá as taxas de juros inalteradas por mais tempo”, assinala o especialista.
Inclusive, para Annalisa Piazza, analista de pesquisa de renda fixa da MFS Investment Management, apesar das revisões para cima do PIB e da inflação, a decisão do BCE de manter as taxas estáveis ressalta sua postura cautelosa. “A probabilidade de uma alta de juros no curto prazo continua baixa, já que as incertezas dominam as perspectivas. Lagarde evitou endossar os comentários hawkish de outros membros do BCE, o que indica um consenso para manter a atual orientação da política monetária. A decisão unânime de manter as taxas inalteradas e preservar a flexibilidade sugere que não haverá mudanças iminentes na combinação de políticas”, pondera Piazza.
Atualmente, os mercados atribuem cerca de 20% de probabilidade a uma alta de juros do BCE antes do final de 2026, um cenário que parece prematuro, salvo se ocorrer uma surpresa positiva significativa do crescimento na segunda metade de 2026. “Por outro lado, o Federal Reserve dos Estados Unidos voltou a uma fase de afrouxamento monetário, com uma política cada vez mais condicionada pela evolução do mercado de trabalho, uma divergência que poderia se tornar um motor mais relevante da dinâmica relativa das taxas de juros e das moedas”, comenta Nicolas Forest, CIO da Candriam.



