A eleição presidencial de 2026 deve representar um ponto de inflexão para o câmbio e a condução da política econômica no Brasil. Durante o painel de macroeconomia realizado na TAG Summit, evento promovido pelo multifamily office TAG Investimentos, especialistas apontaram que os cenários projetados para a taxa de câmbio e para os fundamentos fiscais divergem substancialmente a depender do resultado do pleito.
Samuel Pessôa, chefe do Centro de Crescimento Econômico do FGV IBRE, resumiu a bifurcação: “Ano que vem, o jogo da moeda é eleitoral e são dois cenários muito diferentes. A continuidade de Lula, com economia mais intervencionista e o gasto público fazendo a atividade girar; aí teremos o evento do mercado produzindo enfraquecimento [do real]. Por outro lado, se o processo sinaliza uma nova orientação política que tenha chance de arrumar de forma mais permanente o fiscal, tem espaço grande para melhorar e a moeda se valorizar muito.”
A avaliação foi compartilhada pelos demais participantes. Segundo Lívio Ribeiro, sócio da BRCG e pesquisador do FGV IBRE, os modelos de câmbio desenvolvidos pelo centro de estudos já refletem uma elevada dispersão de cenários: “A média do modelo aponta para R$ 5,75, mas ela não significa nada. Os extremos são países diferentes.”
Ribeiro destacou que o real já mostrou forte volatilidade em 2024, quando o dólar superou brevemente R$ 6 em meio a temores de “dominância fiscal” — situação em que a política fiscal fragilizada compromete a eficácia da política monetária e afeta expectativas de inflação e câmbio.
A incerteza cambial, segundo os painelistas, não decorre apenas de fatores técnicos, mas também da dinâmica eleitoral. Para Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do FGV IBRE, “as eleições podem representar a escolha entre manter um caminho de populismo fiscal ou adotar uma agenda de ajuste e reformas estruturais.” Ela acrescentou que, embora a continuidade do atual governo indique um viés de expansão do gasto público, “a própria inflação e a insatisfação popular que ela gera podem forçar alguma arrumação da casa, seja por convicção ou necessidade.”
Além da política cambial, o cenário fiscal também foi discutido sob a ótica de 2026. Samuel Pessôa alertou que o país pode chegar ao próximo governo com a dívida em trajetória crescente, juros altos e o setor privado enfraquecido após anos de aperto monetário prolongado: “A gente chega ao final de 2026 com um setor privado cansado. Ou haverá uma reversão com reformas fiscais estruturais ou o país continuará patinando.”
O painel indicou que, mesmo que medidas impopulares sejam evitadas até a eleição, o governo eleito — seja de continuidade ou de oposição — terá de enfrentar desafios como o controle de gastos obrigatórios, a revisão de indexadores de despesas públicas e a busca de novas fontes de receita ou privatizações. Samuel destacou que “se conseguirmos reverter a dinâmica do gasto, isso já vai gerar uma queda de juros instantânea e entraríamos em um círculo virtuoso”. Caso contrário, os prêmios de risco embutidos nos juros e no câmbio permanecerão elevados.
A chamada “dominância fiscal”, que esteve próxima em 2024, pode voltar ao radar se não houver clareza sobre o compromisso fiscal do próximo governo. Os especialistas também lembraram que, embora fatores externos como a política monetária dos Estados Unidos e o desempenho da China influenciem o real, “o componente político-fiscal será dominante na tendência do câmbio até 2026”, conforme frisou Ribeiro.
Perspectiva do mercado: o “trade de eleição”
O debate reforçou que investidores já começam a precificar cenários eleitorais — o chamado trade de eleição. Se houver sinalização de continuidade de políticas expansionistas sem reformas, é esperado um prêmio de risco mais alto sobre os ativos brasileiros. Por outro lado, uma mudança de orientação econômica poderia abrir espaço para apreciação do real e queda dos juros.
“Nos últimos 20 anos, todo governo que produziu inflação foi penalizado pela democracia”, lembrou Samuel, ressaltando que, historicamente, a sociedade brasileira reage a desajustes macroeconômicos, o que pode influenciar o desfecho eleitoral.