As perspectivas das gestoras sobre o percurso de Wall Street continuam positivas, apesar de alguns analistas advertirem que o mercado bursátil precisava de uma correção “para reativar o avanço e eliminar os especuladores”. A realidade é que as firmas de investimento concordam que não se pode ignorar a renda variável norte-americana, embora reconheçam que é necessário um novo enfoque.
Na opinião de George Brown, economista sênior dos EUA na Schroders, mesmo em meio a todos os reveses que preocuparam os investidores no início do ano — incluindo o aumento das tarifas, o enfraquecimento do dólar e o fluxo de capital global para fora dos Estados Unidos — as perspectivas de crescimento da economia norte-americana continuam sólidas.
“Dois importantes índices bursáteis dos EUA, o S&P 500, que representa as grandes capitalizações, e o NASDAQ, carregado de tecnologia, dispararam para máximas históricas. Os cortes de juros do Federal Reserve (Fed) também podem beneficiar os mercados, já que a história sugere que cortes em uma economia em crescimento, em vez de uma recessão, podem ser positivos para as ações”, argumenta Brown.
Fim da concentração
Um argumento claro a favor de não virar as costas à renda variável norte-americana é dado por Diana Wagner, gestora de renda variável da Capital Group, ao afirmar que o mercado caminha rumo a uma menor concentração. “Para 2026, acredito que certos fatores poderiam impulsionar o crescimento dos lucros corporativos e sustentar o mercado, como as medidas de estímulo previstas na reforma fiscal e a maior clareza no âmbito político. Há muitas oportunidades além das sete magníficas, e acredito que a diversificação que começamos a ver este ano vai continuar”, aponta Wagner.
Na sua opinião, estamos diante de uma “ampliação da liderança do mercado”. Segundo explica a gestora da Capital Group, “a participação na liderança do mercado vem aumentando desde o nível mínimo registrado em junho de 2023, quando as sete magníficas dominaram a rentabilidade do S&P 500”. De fato, em períodos móveis de seis meses até 30 de junho de 2025, o percentual de companhias que registraram rentabilidade superior à mediana das sete magníficas alcançou 51% — 251 empresas — contra 1%, cinco companhias, em junho de 2023.
Para Wagner, outro indício significativo é que, desde 2 de abril, quando a Casa Branca anunciou sua proposta de tarifas, “o percentual de companhias que negociavam acima de sua média em períodos móveis de 200 dias subiu de 16% para 64% no final do mês passado”.
Seleção de valores
Nesse contexto, Frank Thormann, gestor de carteiras de renda variável global da Schroders, defende que os investidores podem ter melhor desempenho no longo prazo se se concentrarem nos fundamentos das empresas e não se preocuparem excessivamente com o clima atual do mercado.
“A longo prazo, os preços das ações acompanham os lucros corporativos, e as melhores empresas se beneficiam de características como operar em um setor com altas barreiras de entrada, ofertas de produtos superiores, ganhos de participação de mercado e poder de precificação, que sustentam uma sólida distribuição de lucros ao longo do ciclo de mercado”, acrescenta, destacando a importância da seleção de valores.
Uma reflexão que, segundo Raphaël Thuin, Head of Capital Markets Strategies da Tikehau Capital, também se aplica ao atrativo setor tecnológico norte-americano. Segundo sua análise, as elevadas valorizações — especialmente na renda variável dos EUA — deixam pouco espaço para erros por parte dos investidores; por isso, ele considera que a dispersão oferece oportunidades de investimento em determinados segmentos bem identificados.
“Nos Estados Unidos, o setor tecnológico continua sendo essencial em qualquer alocação de renda variável. Na última década, os lucros das empresas de tecnologia cresceram mais rápido do que o mercado, graças em particular à publicidade online, à inteligência artificial e à nuvem. Os últimos resultados da Nvidia são uma ilustração perfeita disso e confirmam a solidez do ciclo da IA”, argumenta Thuin.
No caso do setor tecnológico e da IA, a mensagem do especialista da Tikehau Capital é simples: “Manter a exposição parece adequado no longo prazo, ao mesmo tempo em que se favorece uma abordagem seletiva centrada em atores com visibilidade sobre a demanda, poder de precificação e capacidade de gerar fluxos de caixa que cubram os investimentos. Ao mesmo tempo, será importante monitorar a transformação efetiva das carteiras de pedidos, a disciplina financeira, a trajetória dos investimentos e o acesso e o custo da energia”.
Brechas de crescimento
Ao falar sobre seletividade, Thormann menciona “buscar brechas de crescimento”. O gestor da Schroders considera que é possível alcançar retornos superiores aos índices de referência buscando “brechas de crescimento” que surgem com empresas cujas perspectivas de crescimento de longo prazo estão sendo subestimadas pelo mercado em geral.
“Para muitas empresas, as opiniões de consenso parecem corretas, mas ainda há situações nas quais outros analistas não parecem ter reconhecido completamente os benefícios potenciais de longo prazo de uma vantagem competitiva. Parte disso se deve ao pensamento de curto prazo, que se tornou ainda mais frequente devido a tecnologias como o trading algorítmico, bem como à crescente participação de investidores de varejo nos mercados”, afirma.
A gestora acredita que o núcleo de uma carteira centrada em identificar brechas de crescimento pode ser construído com empresas que tenham vantagens competitivas excepcionais. “Essas poderiam ser uma vantagem estrutural, como um canal de distribuição único, ou o impacto de longo prazo de operar em um setor com importantes barreiras de entrada. Ou a empresa pode ter uma vantagem devido à propriedade intelectual ou a uma marca dominante com alto nível de fidelidade por parte dos clientes, que os concorrentes não conseguem igualar. As posições oportunistas para uma carteira desse tipo incluem empresas que podem estar no auge do seu ciclo econômico ou companhias recentemente pressionadas, com novas equipes de gestão ou abordagens que possam estar se preparando para uma mudança significativa”, conclui Thormann.



