O governo de Donald Trump continua rompendo paradigmas, consumando feitos sem precedentes. O secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Scott Bessent, informou na última semana que negocia uma linha de swap de 20 bilhões de dólares com o Banco Central da República Argentina (BCRA). Ele também afirmou que a administração norte-americana está preparada para conceder um crédito stand-by “significativo” por meio do Fundo de Estabilização de Câmbios e que está disposta a comprar títulos em dólares da Argentina, tanto no mercado primário quanto no secundário. Isso será feito “quando as condições justificarem”, esclareceu.
A confirmação oficial chegou um dia após o encontro entre Donald Trump e o presidente argentino, o libertário Javier Milei, em Nova York, no qual o próprio Trump teceu inúmeros elogios ao mandatário argentino. Em seguida, reiterou sua posição na plataforma X, e Bessent comentou a publicação, acrescentando: “Estamos dispostos a fazer o que for necessário para apoiar a Argentina e o povo argentino”.
Além disso, o secretário do Tesouro afirmou que entrou “em contato com várias empresas norte-americanas que têm a intenção de realizar importantes investimentos estrangeiros diretos em múltiplos setores da Argentina caso o resultado das eleições seja positivo”. O funcionário esclareceu que “imediatamente após as eleições, começaremos a trabalhar com o governo argentino nos reembolsos de suas principais dívidas”. Mais tarde, ressaltou aos jornalistas que “os Estados Unidos não imporão nenhuma nova condição ou exigência” à Argentina.
Paralelamente, na véspera, também foi anunciado que o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) acelerarão sua assistência financeira ao país, com um montante conjunto de 7,9 bilhões de dólares, com o objetivo de ajudar o governo de Javier Milei a enfrentar a crise.
Eleições decisivas
O apoio explícito e a ajuda financeira dos Estados Unidos chegam duas semanas após a derrota do partido de Javier Milei nas eleições da província de Buenos Aires, que concentra cerca de 40% do eleitorado do país. Nenhuma pesquisa chegou perto da realidade, e a oposição teve uma vantagem de 13 pontos sobre o governo. No domingo, 26 de outubro próximo, haverá eleições legislativas em nível nacional na Argentina. O presidente Milei precisa ampliar sua representação parlamentar para aprovar reformas estruturais, após ter colocado em ordem a macroeconomia e o front fiscal.
No dia seguinte à derrota em território bonaerense, os ativos argentinos despencaram, revivendo o fantasma das eleições primárias obrigatórias (PASO) de 2019, quando o mercado desabou 50% diante da grande vantagem que o PJ obteve sobre o ex-presidente Mauricio Macri.
No último 8 de setembro, os títulos argentinos em dólares lideraram as quedas entre emergentes, o índice Merval recuou quase 13% e o peso argentino se desvalorizou 4% frente ao dólar. Nos dias seguintes, a dinâmica negativa continuou: o pessimismo persistiu, e na sexta-feira, 19, o Banco Central interveio no mercado de câmbio com a maior venda diária de dólares em 6 anos (678 milhões) para conter a moeda.
O ministro da Economia, Luis Caputo, reiterou após a derrota eleitoral que o dólar continuaria contido dentro da banda cambial estabelecida em 14 de abril, quando, de forma surpreendente, a Argentina suspendeu o controle dos tipos de câmbio. Desde essa data, o país sul-americano implementou um novo regime de flutuação administrada, com uma banda que oscila entre 1.000 e 1.400 pesos por dólar, com ampliação mensal de 1%. O BCRA intervém no mercado quando os limites da banda são atingidos.
Grande parte da explicação para o pessimismo financeiro está relacionada ao fato de que o governo enfrenta vencimentos de dívida de 12 bilhões de dólares em 2026, e o mercado observa de perto as reservas do Banco Central. Após o forte respaldo dos Estados Unidos nesta semana, o otimismo tomou conta do mercado: os títulos em dólares subiram até 12%, e o índice EMBI+ Argentina — referência do risco-país elaborado pelo JP Morgan — mostrou uma queda de cerca de 400 pontos, atingiu uma mínima intradiária de 839 pontos e fechou em torno de 900. Na sexta-feira anterior, essa referência havia alcançado um máximo de 1.516 pontos-base, quando o dólar tocou o teto da banda, obrigando o BCRA a intervir no mercado.
A opinião dos analistas
“O governo parece ter conseguido reverter um cenário em que as expectativas haviam se desancorado”, afirmou Eric Ritondale, economista-chefe da PUENTE, após a divulgação dos detalhes da ajuda econômica dos Estados Unidos. Em sua opinião, a reação do mercado antes e depois do anúncio indica que a volatilidade das últimas semanas “foi mais de expectativas do que de fundamentos econômicos”.
“Após as eleições, esperamos que a equipe econômica busque recompor reservas, avançar em uma atualização cambial e reduzir juros para reativar a economia. Esse conjunto de medidas, se consolidado, pode estabelecer as bases para uma recuperação”, acrescentou.
O Grupo IEB publicou um relatório especial intitulado “Mudança de expectativas”, no qual afirmou que “essa mudança de tendência nas expectativas alivia o panorama cambial e monetário, abrindo espaço para possíveis compras de divisas pelo Tesouro, potencial redução de juros via diminuição de depósitos compulsórios e/ou queda da taxa de passivos remunerados”.
O relatório destacou um ponto central, especialmente com vistas às próximas eleições: é necessário que “o impacto na economia real seja sentido o mais rapidamente possível. O controle do câmbio e a redução dos juros serão um bom ponto de partida”. Para conter a inflação, o governo aplicou um ajuste sem precedentes.
Por sua vez, a Delphos Investments reiterou nesta quarta-feira a recomendação de cautela aos seus investidores até que fique confirmado que o piso das ações argentinas ficou para trás. “O mercado reage de forma desproporcional tanto a notícias positivas quanto negativas, e enquanto no fim de semana predominaram sinais favoráveis de natureza econômica, os catalisadores políticos — talvez os mais necessários — continuam escassos e imprevisíveis”. O Departamento de Pesquisa da Capital Markets Argentina escreveu em um relatório que espera uma elevada volatilidade no mercado argentino no curto prazo.